Querô... Impressões sobre o processo.

06 de julho de 2008. Dilmas, Ratos, Berecos, Querôs, Vaguinhos, Bobo Plin. As personagens de Plínio Marcos ganham voz. Começamos a nos conhecer. Tem início o processo. Logo no primeiro dia várias questões são levantadas. Qual o papel da mídia hoje? O que a peça “Querô – Uma Reportagem Maldita” tem a ver com a gente, do ponto de vista individual, e não sistêmico? O que, pessoalmente, eu tenho a ver com isso? Por que contar essa história?

Precisamos nos conhecer melhor. Formamos duplas. Novas duplas, novos parceiros. Cena combinada, cena improvisada. O que é teatro épico? A cena aconteceu? Havia escuta? A cena deve começar num ponto e terminar em outro! O objetivo está sempre no outro! Crie problema para o colega! Ator não sente, ator age! O diretor provoca, nós agimos, começa o jogo.

Uma grande roda é formada. Uma pessoa vai para o centro. Paredão? Não! Basta responder: Qual a pessoa mais engraçada da roda, para você? Quem você escolheria para ser seu patrão? Quem você escolheria para ser seu empregado? Novas relações se estabelecem. Relações que devem acontecer dentro de um bordel.

As portas do cabaré “Leite da Mulher Amada” são abertas! Cantoras, putas, clientes. Corpos que vão ganhando vida, aos pouquinhos, senão machuca. Onde está a puta dentro de você? Opa! Apareceu!

Cantamos “ei, chegue mais perto”, e o Querô entra em cena. Mas traz com ele outro Querô. E mais outro. Ai meu Deus, e ainda outro! São quatro Querôs. Com suas respectivas mães. Não é a Leda. São as Ledas. As Violetas. Os repórteres. As “Jus”...

E tem o coro, claro! Somos muitos, pouquíssimos abandonaram o barco. Ah... o coro... É ele quem conta a história. A estrutura vai se desenhando. São quatro elencos. São quatro peles diferentes para a mesma história.

O processo criativo vai se instalando. Vamos observando, estudando, trocando. Um descobre uma coisa aqui, outro acolá, eu pego a idéia do outro, ele transforma a minha. O barco-cabaré está navegando. Mas não em um mar calmo. É um fio de navalha. Nesse barco o ator precisa ter uma energia de violência, de sexualidade, senão o barco afunda. A cada dia, tudo tem que acontecer de novo, de verdade, não dá pra relaxar. E tem que ter tesão, senão fica chato.

Agora outros vão chegar mais perto, ainda faltavam eles pra completar essa obra. Cada dia um elenco. Cada dia uma mistura diferente de pessoalidades. Vai ser na sorte. E na raça.

"Apesar de acordados, ainda sonhamos."

Fazer teatro é um exercício diário. É o exercício de uma vida. É o que venho tentando fazer...
Assistir teatro é outra coisa. Às vezes assistir teatro se torna um exercício, outras é uma experiência. E de vez em quando não é nada, infelizmente.

Eu fui assistir teatro nesta sexta-feira, dia 31 de outubro de 2008, e foi uma experiência. Das mais marcantes. Das mais fortes que já tive assistindo teatro.
Foi a peça "Orestéia - O Canto do Bode", do Grupo Folias D'Arte, a responsável.
Foram 3 horas e meia de imagens fortes, de atores plenos, de risos, de lágrimas, de história, de vida. A trilogia de Ésquilo, Orestéia (integrada pelas peças Agamênon, Coéforas e Eumênides), foi sacudida e incorporada pelo grupo.
InCORPORADA literalmente.
Nada sobra. Tudo é vivo.

O palhaço-corifeu diz "Apesar de acordados, ainda sonhamos".
E canta:
"Um Pierrô apaixonado,
Que vivia só cantando,
Por causa de uma Colombina,
Acabou chorando,
Acabou chorando.
A Colombina entrou no botequim,
Bebeu, bebeu, saiu assim, assim,
Dizendo: Pierrô cacete,
Vou tomar sorvete,
Com o Arlequim.
Um grande amor tem sempre um triste fim,
Com o Pierrô aconteceu assim!
Levando este grande "chute",
Foi tomar vermute Com amendoim.
Um Pierrô apaixonado,
Que vivia só cantando,
Por causa de uma Colombina,
Acabou chorando,
Acabou chorando."


E termina a peça...

Pessoas

Tenho pensado nas pessoas.
Até onde conhecemos alguém?
Até onde alguém se permite conhecer?
Até onde enxergamos apenas o que queremos nas pessoas, ou o que queremos que ela seja?

Mas... quer saber?
Assim é que tem movimento. Assim é que tem surpresas. Boas e ruins.
Estar com as pessoas é isso, uma gangorra de possibilidades e de riscos.

Eu quero as possibilidades e os riscos. De verdade.

Suposições

Engraçado... acabo de pensar numa idéia maluca que relaciona o tempo e o homem.
Quando faz frio, muito frio, por muitos dias seguidos, somos impulsionados a entrar em contato com a gente mesmo, como se tivéssemos que nos voltar pra dentro, para o nosso universo interior, para assim nos aquecer.
E nessa "onda", as idéias começam a dançar dentro da gente, pensamentos são colocados em ordem, fichas caem, e podemos, talvez, ter um momento de lucidez.
Em São Paulo faz frio há vários dias, e algumas fichas estão caindo na minha cachola.
E... tive um belo momento de lucidez hoje pela manhã, compartilhado com uma amiga querida e parceira de trabalho. Fazia um frio...
São só suposições.

Para ela...

Hoje é aniversário da minha irmã. Da minha irmã de sangue, nascida da mesma mãe e mesmo pai (a vida me deu de presente também outras irmãs, irmãs de alma, que eu carrego e carregarei no meu coração a vida inteira).
Mas hoje eu quero falar da minha irmã de sangue...
A minha irmã aniversariante é dois anos mais jovem que eu.
A minha irmã aniversariante é linda, ela tem cabelos dourados, pele queimada de sol, e um sorriso brejeiro no rosto.
A minha irmã aniversariante carrega um ritmo próprio no corpo dela, ritmo que ela tem cada vez mais se permitido descobrir, e vai descobrir muito mais.
A minha irmã aniversariante dança. Ela dança. Lindamente.
A minha irmã aniversariante às vezes é bem brava, a danada sabe "soltar os cachorros".
A minha irmã aniversariante é mãe de uma cachorrinha que se chama Mel.
Eu, há algum tempo, estou descobrindo a minha irmã. Estamos nos descobrindo, estamos nos descobrindo com o coração. Nessa descoberta, às vezes ainda tateamos as palavras, palavras que nunca deixam de estar carregadas de ternura. Eu vibro com ela. Ela vibra comigo. Assim estamos seguindo. Assim seguiremos. De mãos dadas.
Eu amo a minha irmã.

Pequeno diálogo entre elas:
"- Parabéeeeens! Muitos anos de vida, saúde, paz, alegria, amor, sucesso, realizações...
- Pra você também!
- Pra mim também? Brigada!
"

Esse "pra você também", só ela podia ter dado. Só ela.

De outros

Tá... Esse blog é pra divagar, para treinar a escrita... mas também pode aparecer por aqui divagações de outros, que me atravessam por alguma razão.

E essa do Robert Bresson me pediu para vir pra cá, é do seu livro "Notas sobre o cinematógrafo", que é uma coletânea de frases que ele foi formulando ao longo de vários anos, em seu caminho como cineasta:


"Cave onde você está. Não deslize para outros lugares. Dupla, tripla camada das coisas."


Fico por aqui.

O homem do abacaxi

Há 45 minutos atrás eu andava pela rua e o homem do abacaxi, em sua kombi cheia de abacaxis, dizia em seu microfone improvisado:
" - Olha o abacaxi. Olha o abacaxi. Abacaxi docinho. É um abacaxi bem grande."
Eu já escutei isso na rua várias vezes. Mas sinceramente, não sei se já escutei "é um abacaxi bem grande". Me soou fantástica essa frase. Adorei ela. Me tirou do cotidiano. Me levou para um outro lugar. O rapaz que caminhava perto de mim também ouviu, riu, e disse para alguém que seguia ao seu lado: " - Abacaxi bem grande...".

Bem que isso podia acontecer mais vezes.

Acontece - Parte II

"A vida não é o que nos acontece. É o que a gente faz com o que nos acontece."

Acabo de ler essa frase num blog - parafrancisco.blogspot.com - e achei que valia colocá-la aqui, pois se relaciona com o "Acontece" abaixo.
De alguma forma.

Acontece

Um dia, pela manhã ao acordar, ela abriu a janela de seu quarto, olhou para fora e não viu nada. Absolutamente nada. Ela olhava sem enxergar. Ficou parada assim por alguns minutos. Então percebeu que não via, mas sentia. Sentia com os olhos de dentro. Um turbilhão de imagens, pensamentos e emoções atravessavam seu corpo sem nenhuma organização. Isso durou alguns poucos minutos.

Esse turbilhão voltou a se repetir. Uma e outra e outras vezes. Ela de vez em quando fica assim, sem enxergar a realidade palpável das coisas ao seu redor. Só lhe resta sua realidade interior, acelerada e um pouco desconexa, que ela não consegue tocar, apenas viver.

Quando ela sente esse turbilhão em sua casa, e o movimento interior está mais acelerado que o comum, pode acontecer dela caminhar pelo espaço, de olhos abertos mas sem enxergar, e sem esbarrar nos móveis! Vejam que proeza!

Dia desses ela caminhou pela casa mais tempo que o normal, o turbilhão estava à toda no seu corpo recém acordado de uma noite mal dormida. Ela chegou até a cozinha. Foi quando se deparou com uma pilha de vasilhas para lavar sobre a pia. Aí ela olhou e viu. E sorriu.

Sim

"No 7 de setembro tinha um casamento
tinha um casamento no 7 de setembro
tinha um casamento
no 7 de setembro tinha um casamento.

Errata: tinha não. TEM. E eu tô louca pra ele chegar... porque eu nunca vou me esquecer desse acontecimento no meio de minhas retinas tão fatigadas."


Eu escrevi esse recado no dia 30 de agosto para um amigo muito querido. Foi hoje.
Ele e ela, hoje, disseram sim. Sim para muitas coisas, mas acho que o mais importante, disseram sim para o amor deles. Para o amor que eles sentem um pelo outro. E isso é bonito, muito bonito.
Ah... se todos nós disséssemos sim mais vezes. Sim para o amor, em suas variadas formas.
Eu chorei. Ele chorou. Ela chorou. Acho que eu nunca vou me esquecer desse acontecimento no meio de minhas retinas tão fatigadas, porque eles são tão queridos, tão amados...

Sobre pais e histórias. Ou, sobre histórias de pais.

Pai.

Um dia você se deitou ao meu lado na cama e me contou histórias para que eu conseguisse dormir. Era uma época em que meu sono se recusava a aparecer. Era uma época em que descobri apocalipses e senti medo. Mas as suas histórias me embalaram. Por vários dias, meses e anos. Até que um dia você achou que eu já estava grandinha para você se deitar na cama comigo. Mas eu ainda queria as histórias. Então pedia-lhe para contá-las no carro, quando viajávamos de férias. Ah, como eu gostava dessas histórias.

Mas hoje eu quero lhe contar uma história. Não é bem uma história, mas algo que quero lhe dizer. Sabe pai, uma das coisas mais bonitas que aprendi com você, e que por isso guardo muito orgulho de ti, foi uma palavrinha que ressoa pouco no mundo de hoje. É uma palavrinha pequena: ÉTICA. Pequena em sílabas e grande em dimensão. As pessoas hoje pai, se esqueceram dessa palavra. Se esqueceram de praticá-la. O sistema capitalista se apropriou dela distorcendo sua lógica para imprimir-lhe novo caráter. O que vale, para nosso mundão hoje, é a ética capitalista. Só ela te capacita para adentrar com a ferocidade necessária nesse universo do capital. E assim, lá se vai a ética, aquela ética que você me ensinou, pelos bueiros do capitalismo moderno. Ou será pós-moderno? Ou será... ultrapassado?

Era uma vez

Era uma vez uma menina que gostava de brincar de fazer personagens e criar histórias. Quando a família dela se reunia, na Páscoa, Natal, aniversários y otras cositas más, ela dava um jeitinho de "pegar" os primos e enfeitá-los com maquiagens e acessórios para contar uma historinha. Alguns eram mais resistentes, outros embarcavam na dela. Fato é que ela sempre dava um jeitinho de ser a principal. Como gostava de aparecer... a menina.

Hoje, lembrando dessa menina, penso que no fundo não era ela quem gostava de aparecer. Era algo dentro dela que pedia pra sair pra fora, pedia não, quase implorava. Fosse como fosse. E ela deixava. Fosse como fosse.

Esse negócio de escrever

Vai ser assim...
quando der.

Ela

Ela sentou-se à mesa, pegou seu caderno que há muito tempo esperava um fim, pegou sua caneta vermelha, e pôs-se a pensar. Pensou, pensou. Apoiou seu pé grande sobre a cadeira. E continuou a pensar. Fazia caretas. Falava sozinha. Mordia a ponta da caneta. Só não se atrevia a começar a escrever.

Começar a escrever seria um grande passo. Como aqueles que seu pé e pernas longas estavam acostumadas a dar. Ela não se atrevia. Sentia receio do que poderia vir a partir dali. Sentia medo.

Ah... o medo. Vilão dos corações atrapalhados, das almas sensíveis, dos homens. O medo vem e vai. O bom mesmo é quando ele vem acompanhado da sua colega coragem, lhe sussurrando ao ouvido. Aí ele acena e logo vai embora, seguir seu caminho por aí.

Bom, mas eu estava falando mesmo era do pé grande da moça. Ou melhor, dos passos largos que ela dava. Não, me perdoe, estava dizendo sobre o caderno que ela comprou há muito tempo e que esperava um fim. Perdão, não era nada disso. Estou um pouco confusa no momento e voltarei outra hora para falar sobre ELA.